“Estou em Teletrabalho, a articulação destas duas coisas não é fácil”

“Estou em Teletrabalho, a articulação destas duas coisas não é fácil”

27 de Maio, 2020 0

Testemunho e propostas de Encarregada de Educação de aluno do 1º Ciclo.

O Agrupamento de Escolas do Viso encontra-se numa zona economicamente desfavorecida no centro do Porto. Aqui temos vivido situações de desigualdades abismais, o que tem limitado o acesso ao Ensino de centenas de jovens e crianças. Incluo aqui, e de uma forma penosa, alunos com Necessidades Educativas Especiais que, além do retrocesso que sentem pela falha nas terapias e consultas dos especialistas, o Ensino não está a contemplar programas que se adaptem às suas dificuldades e limitações.

Tenho acompanhado alunos que não têm computador nem impressora em casa e fazem os trabalhos através do telemóvel; pais humildes e com poucas qualificações escolares “perdidos” pois não conseguem apoiar os filhos no estudo; casais com 3 e 4 filhos a estudar, onde existe apenas um computador; famílias sem acesso à internet; pais em teletrabalho com regime de cumprimento de horário, então os filhos estudam aos finais da tarde e aos fins-de-semana… Tudo está ao contrário aqui! Nada está bem!…

A professora do meu filho, tendo em conta que existem alunos na turma que não teriam condições para um Ensino à Distância digno (em plataformas, com reuniões síncronas, um local de exposição de dúvidas, onde se manteria contacto entre alunos e professores, forçaria ao cumprimento de horários e outros compromissos…) decidiu acompanhar os seus alunos por email, por forma a chegar a todos igualitariamente! No final do período avalia os alunos pelo Caderno onde registam os trabalhos!

A decisão da Professora é justa e louvável, no entanto, o meu testemunho pessoal é: o meu filho vê as aulas da Telescola de manhã e faz os resumos no caderno. Quando a Professora manda uma atividade por mail ele faz, quando não manda eu pego nos Manuais Escolares e trabalho com ele as matérias que lá estão.
Eu estou em Teletrabalho, a articulação destas duas coisas não é fácil, e tenho mais um filho pequeno. Mas tenho dois computadores, acedo à Internet e tenho qualificações suficientes para apoiar o meu filho nas suas dúvidas! É assim que vou colmatando com as falhas do Ensino que proporcionam ao meu filho neste momento!!! Questiono-me acerca da avaliação que lhe vai ser feita; assusta-me um pouco o facto dele transitar para o 3º ano, quando o 2º ano é “manco”; e revolta-me saber que à minha volta há quem esteja bem pior!

Propostas e Soluções: Eu gostaria que o Estado tivesse contemplado todos estes possíveis cenários antes de avançar com o Ensino à Distância num País tão disforme. No entanto, já que o fez, era imperativo que se criassem condições para os alunos terem um Ensino digno e com aprendizagens A SÉRIO, não estes “entretenimentos” que estão a ser dados aos alunos!!!! O Governo deveria obrigar as Autarquias a atuar! Câmaras Municipais e Juntas de Freguesia deviam estar há muito tempo a resolver estas questões! Têm a obrigação de articular com as Escolas e procurar resolver os problemas daqueles que não têm equipamentos; dos que necessitam de algum apoio diferenciado; dos que não acedem à internet; e de todos aqueles que estão à margem… Algumas Câmaras sei que estão a fazê-lo, a do Porto não está! A Direção-Geral dos Estabelecimentos Escolares anda a fazer o quê? Não fiscaliza?! A DGEst conhece a realidade atual do Ensino no nosso País?

Está na hora da DGEst articular com as Câmaras; as Câmaras articularem com as Juntas; as Juntas articularem com as Escolas; as Escolas articularem com Associações de Pais e Estudantes; mas de uma forma séria! Os “grandes” não podem continuar a tomar decisões sem ouvir os “pequenos”, quando é da vida dos “pequenos” que se trata…

foto de flickr.com/Stephen Ransom